segunda-feira, 12 de agosto de 2013

Cultura mineira: Defendendo o verdadeiro queijo Minas

Bem que eu já tinha percebido que há queijos e queijos. Com meu talento natural para ficar entupida, encatarrada y otras cositas más quando como queijo, os "curados" me pareciam diferentes, amigáveis quando não inofensivos, e infinitamente mais saborosos do que os queijos comuns.

Mas nem sempre. Algo me escapava entre a origem e os efeitos. Precisei ir a Belo Horizonte dar um curso, meses atrás, para me iniciar na verdadeira questão: as regiões altas de Minas Gerais ainda produzem queijo com leite cru, não pasteurizado, que ao passar algumas semanas maturando fica livre de qualquer micróbio nocivo e por isso se chama curado. "Curado de quê?", pergunta o diretor Helvécio Ratton. "Das doencinhas do queijo", responde o produtor mineiro.

Esse diálogo acontece no filme O mineiro e o queijo , documentário sobre a vida e o trabalho de quem mantém a tradição queijeira há cinco ou seis gerações, desde que os portugueses da Serra da Estrela trouxeram para a região a sua própria cultura. Foi o início do queijo "minas", famoso no mundo. Só que em 1950, tomado por uma febre higienista importada dos Estados Unidos, o governo brasileiro decretou que todo leite teria que ser pasteurizado antes de virar alimento. Desculpa: para combater brucelose, tuberculose e qualquer outra infecção que a teta da vaca pudesse transmitir. Assim se poderia consumir o queijo fresco, sem esperar pela cura.

A cura não acontece quando o leite do queijo é pasteurizado. Cru, ele contém enzimas e lactobacilos que com o passar dos dias trabalham as proteínas e o açúcar do leite tornando-o mais fácil de digerir. Como os bons queijos franceses e italianos, pode ser oferecido até como auxiliar da digestão depois de almoços e jantares. É a combinação de microorganismos do leite e do ar local que faz o serviço. Se o leite for pasteurizado, porém, terá apenas bactérias mortas; ele coalha, sim, e solta o soro, sim, mas é mera massa proteica coagulada, com baixo índice de acidez e alta propensão a ser indigesto.

Queijos curados verdadeiros passaram a ser vendidos por baixo do balcão. Com medo da vigilância sanitária, o comerciante começava respondendo que não tinha. Depois de conhecer o freguês, aí sim o queijo, já de casca grossa, amarelada, finalmente aparecia.

Serra da Canastra, Serro e Alto Paranaíba são as regiões de excelência comprovada para essa produção. O processo é praticamente o mesmo, mas os queijos saem diferentes em sabor e consistência. Hoje se chamam "queijos artesanais de Minas" e fazem parte do patrimônio cultural imaterial brasileiro. Não confundir com os "tipo minas" e "minas padrão" com que as multinacionais dos laticínios nos enganam. Os bons ainda são, infelizmente, para os poucos que podem ir a Minas comprar.

17 comentários:

  1. Ai e como são bons, né! Mas mesmo aqui em Minas, nem sempre os queijos são produzidos com o leite cru, encontramos muitos que são pasteurizados e depois viram a massa do queijo por adição do coalho, o que faz um queijo mais ácido, às vezes até com gosto de xixi de vaca (não que eu já tenha provado, né...). Nesse sentido eu tenho o privilégio de morar no Serro, mas ainda assim não é tão fácil encontrar o queijo artesanal, esse que leva tempo pra ficar pronto. Infelizmente a pressa tem vencido a qualidade...
    Um beijo em você, Sonia, gosto muito dos seus escritos!

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  2. Um beijo com queijo, Isabela! ;-)

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  3. Oi Sonia! Queijo é assunto sério, não,rsss? Podemos encontrar muitos queijos"verdadeiros" aqui em São Lourenço-MG. Concordo plenamente quando cita o queijo pasteurizado, caramba, que coisa ruim! Um dos meus preferidos e encontrados aqui em muitos locais é o Queijo Canastra (merece letra maiúscula!. Ouro que consumo muito é o Queijo Tirinha que é um tipo muçarela em tiras...olha, esse é 1000! Abraços mineiros e ótimos dias para você!

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  4. Olá Sônia,
    escrevo para saber se pode me ajudar... há alguns anos atrás você foi curadora da série sobre alimentação, no Café Filosófico e, lembro de haver assistido (disponível no google vídeo), uma palestra do Júlio Mukuno, no qual ele comentou que existem três categorias de médicos:"...os que tratam da doença, os que tratam do doente e a terceira, ensina a viver..." Hoje lembrei disso e foi procurar pela palestra, sendo que não encontra mais disponível, portanto, gostaria de saber, se você dispõe de uma cópia dessa palestra, ou sabe como posso conseguir... Achei interessantíssimas as colocações dele e preciso rever. Grata pela tua atenção,
    Tatiana.

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  5. Oi, Tatiana, esse vídeo pode estar disponível na Cultura Marcas, da TV Cultura, já procurou lá? Eu tenho uma cópia. Se você não consegui lár, me escreva para o email shirsch@terra.com.br dando seu endereço que eu copio e mando. Um abraço!

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  6. Obrigada, Sônia!
    Irei procurar e caso não consiga, escrevo para você.
    Abraço,
    Tatiana.

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  7. Olá, estou lhe enviando uma TAG, são perguntas e respostas, achei divertido, mas é apenas um convite não precisa responder se não quiser...beijos

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  8. Oi, Sonia!
    Gostaria de saber se a candidíase é transmissível pelo beijo..

    Abraço,
    Raquel

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  9. Oi, Véia, não veio, ou não entendi.

    Oi, Raquel, a candidíase é o crescimento da população habitual de cândidas devido à baixa imunidade. Não precisa ser transmitida, pois se alguém estiver com a imunidade deprimida a ponto de "pegar", nem precisaria de contágio. Não é DST. Mas uma mulher com muito corrimento poderá transmitir ao parceiro uma boa quantidade de fermentos, que podem ou não se alojar nas dobrinhas da glande e nos tecidos irritados.

    Abraços pra ambas!

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  10. Sônia, se eu conseguisse leite cru para fazer iogurte, o processo de "transformação" de leite para iogurte também deixa o leite "curado", como no caso dos queijos? Poderia ficar despreocupado de algo nocivo por estar utilizando leite cru? Estou tentando evitar leite e derivados pasteurizados. Sabe se em algum lugar é vendido existe iogurte natural feito com leite cru?

    Obrigado! :)
    Gustavo

    PS: Sigo seu blog há mais de 3 anos, mas hoje fiz o meu primeiro comentário! Parabéns pelo conteúdo que vc disponibiliza aqui!!

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  11. Oi, Sonia!
    De novo quanto a transmissao da candidiase.. Tudo depende também do nivel de resistência em que a candida se encontra na pessoa que a transmite, certo? Ou não?

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  12. Oi, Gustavo, tudo depende das bactérias existentes no leite. Para iogurte se adiciona lactobacilos bulgaricus, que não são daqui. Nem existem mais no BioRich. Nos EUA você encontra bons yougurt starters para aproveitar ao máximo o leite cru. Um abraço!

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  13. Raquel, de novo: "Oi, Raquel, a candidíase é o crescimento da população habitual de cândidas devido à baixa imunidade. Não precisa ser transmitida, pois se alguém estiver com a imunidade deprimida a ponto de "pegar", nem precisaria de contágio. Não é DST. Mas uma mulher com muito corrimento poderá transmitir ao parceiro uma boa quantidade de fermentos, que podem ou não se alojar nas dobrinhas da glande e nos tecidos irritados."

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  14. Sim, eu entendi.. O que eu quis saber é se, por exemplo, um elevado grau de resistencia da candida transmitida pode permitir que ela se estabeleça mesmo em um organismo com alta imunidade.. Mas acho que a questão gira em torno da imunidade em si mesmo, ne.. Enfim, obrigada!

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  15. Seria este link - Julio Mukuno?

    http://filosofiacomcafe.blogspot.com.br/2009/04/cafe-filosofico-alimentacao-e-ciencia.html

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  16. Uma das palestras foi do Julio. Não sei se é essa porque pra mim não apareceu o vídeo.
    Saudades dele, que partiu tão cedo...

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  17. Tentei e não consegui também ver : (

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