terça-feira, 20 de agosto de 2013

Comer bem: Queijetarianos

Adoro Jamie Oliver e seu estilo bagunceiro de cozinhar, cheio de uma energia alegre e inteligente de quem se dá todo ao que está fazendo, mas sabe que a vida não começa nem acaba ali. Gosto de como ele valoriza os vegetais frescos da horta, ensinando tudo o que pode enquanto colhe e prepara, e acho admirável seu empenho em passar ao público o amor pelas ervas, dizendo coisas como: "O melhor que você tem a fazer é comer muitas folhinhas verdes, elas estão cheias de nutrientes e dão sabor a tudo". É um cozinheiro rude e delicado, meio porquinho, que às vezes tempera demais, mas tão carismático que tem uma legião de fãs no mundo inteiro.

Hoje me fez companhia durante minha meia hora diária de pedaladas no elíptico. Ia cozinhar para sua banda, que é vegetariana, então resolveu fazer canelone, aquela panquequinha de massa de macarrão. Refogou cebola picadinha, alho, espinafre (diferente do nosso), temperou com sal, pimenta, noz-moscada e colocou a mistura no meio dos retângulos de massa comprada pronta. Aí apresentou ao público inglês a nossa conhecida ricota, que esfarelou por cima do recheio. Mais sal e pimenta, e então uma dose generosa de queijo parmezon ralado. Enrolou os canelones, colocando-os sobre um molho de tomates batidos no processador com manjericão, sal e pimenta, cobriu tudo com mozzarella de búfala (a autêntica) e antes de levar ao forno deitou por cima mais uma grossa camada de parmezon ralado, explicando que, como não há carne para dar sabor, o queijo faz esse serviço. Aí foi para a sobremesa: morangos enfiados em espetos de alecrim, caramelizados, para servir com creme... de quê? De outro queijo, mascarpone, batido com açúcar.

É como se houvesse uma frustração do paladar vegetariano a ser compensada por esse elemento lúdico, cremoso ou puxa-puxa, às vezes doce, às vezes salgado e picante., que evoca o seio materno.

Tudo bem se fosse o queijo um alimento inocente como as abobrinhas e as folhinhas verdes, mas não é. Sua digestão pode ser lenta e incompleta, gerando mais muco no estômago do que os ácidos são capazes de dissolver. Enquanto se está comendo queijo no dia a dia ele se acumula, formando eventualmente uma camada grossa de muco no tubo digestivo; esse muco sobe para a garganta, o nariz, os sínus - olha aí a raiz da gripe, da sinusite, do catarro que se tem que tossir para soltar das mucosas. E que alimenta os micróbios e parasitas mais diversos, com um admirável poder de complicar a vida do freguês.

Grande parte da humanidade é intolerante à lactose, que é o açúcar do leite, e também à sua proteína, que é onde a coisa pega mais. Proteínas são combinações de aminoácidos destinadas a formar tecidos. Conforme o tecido muda a combinação. Assim, a proteína que faz o cabelo é diferente da proteína que faz a pele. Quando a gente come alimentos que têm proteína, o fígado a decompõe em aminoácidos e estes circulam pelo sangue para serem colhidos conforme a necessidade de cada setor do organismo. Quando se consome leite de vaca, existe ali uma combinação de aminoácidos própria para construir e renovar tecidos de um animal quadrúpede que tem chifre, pelo, rabo e não frequenta blogs: muge e pasta. É uma combinação geralmente inadequada para seres humanos. A comparação química entre o leite humano e o leite de vaca mostra claramente como nossas necessidades são diferentes.

Queijos são leite de vaca concentrado. Usam-se 15 a 20 litros de leite para produzir um queijo minas de tamanho médio.

Os queijos surgem na cultura humana como elemento de subsistência, uma forma de aproveitar a sobra do leite de vacas, cabras, ovelhas, búfalas, jumentas, iaques e semelhantes. Fáceis de guardar e transportar, versáteis na forma de preparo, variando conforme as regiões e as estações do ano, os queijos sem dúvida têm sido uma ajuda e tanto para a humanidade. Fornecem proteína, gordura, umidade em tempos de seca; gratificam.

Mas esses mesmos queijos acabam sendo usados de uma forma distorcida quando fora da tradição que lhes dá significado. O próprio Jamie Oliver, cozinhando para um chef italiano em outro episódio, é censurado por colocar queijo demais no macarrão. Até os macrobióticos aprovam queijo ralado nessa circunstância, para haver algo que fermente e facilite a digestão da massa, mas tem que ser pouco - para não sobrar e virar muco.

Fora isso, ainda há um lado negro nessa questão: os hormônios e antibióticos dados ao gado leiteiro têm efeitos negativos sobre a nossa vida hormonal. Já há mais de 12 anos que o leite dos Estados Unidos é produzido com hormônios recombinantes, que vêm a ser o seguinte: fatores de crescimento são introduzidos no DNA de bactérias que se multiplicam no rúmen das vacas. Rúmen é o saco digestivo onde primeiro chegam o capim, a cana e a ração, para serem pré-digeridos por bactérias e enzimas. Só depois de completo esse processo é que as vacas (e os outros ruminantes) regurgitam aquela pasta e a engolem de vez para o estômago. Quando elas recebem bactérias geneticamente modificadas (GMO ou OGM, sendo "o" de organismo), passam a produzir a bagatela de 68 litros de leite por dia. Essa referência é antiga, de 1998. O FDA (instituição oficial de controle de drogas e alimentos dos Estados Unidos) aprovou e a coisa cresceu e se multiplicou desde então. A galera natureba, adepta dos orgânicos, já fez muito escândalo. Mas neste mundo capitalista o escândalo é visto com carinho pelos tubarões, pois permite identificar os grupos "subversivos" e, de certa forma, controlá-los.

A segunda  maior audiência deste blog é para um tema que envolve um grave problema de saúde pública, a candidíase. Diariamente chegam comentários desesperados, especialmente de mulheres que estão sofrendo, já fizeram vários tratamentos médicos, não conseguem transar porque dói e arde, o corrimento coça. Um dos grandes culpados dessa situação é o açúcar, ou o excesso de carboidratos, mesmo integrais. Outro: leite e derivados, especialmente queijo.

Como o Brasil não tem tradição alguma nessa produção - nem tinha vacas quando foi descoberto - é comum os queijos locais serem de má qualidade. Alguns nem são queijo de verdade, como o requeijão e o tal do padrão. Alô alô: queijos bons, naturais, daqueles que se pode comer depois da sobremesa para ajudar a digestão, são como os bons vinhos: caros. Aqui e no resto do mundo.

Te cuida, Jamie Oliver. Tô de olho. Um beijo.
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do livro Paixão emagrece amor engorda
postado também em 1/3/2010

18 comentários:

  1. Nossa esse post veio a "calhar" pra mim....uma aluna adulta resolver essa semana abolir leite e seus derivados. Perguntei pq? ela disse...ouvi dizer que faz mal para nós adulto.

    Bom fiquei na minha, ela é uma menina inteligente, estudada....achei melhor deixar pra lá.

    Agora que li esse post...maravilhoso por sinal, estou confusa....o que faço com o meus filhos? Dois adultos e um adolescente?

    beijos

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  2. Bom, Véia, a vaca dá leite aos filhos; a mãe humana dá um prato de comida, porque eles já têm dentes para mastigar e o leite secou há muito tempo... Um abraço!

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  3. Olá,apesar de não ser vegetariana, tenho observado que esta visão deturpada da diete vegetariana é nossa, de quem está de fora. Observo hoje que quem tem a carne como protagonista na alimentação, se contenta com pouco: se tiver o bife, ou o frango assado ou a picanha, o "resto" do cardápio pode ser qualquer coisa com batata,macarrão ou uma saladinha de alface com rodelas de tomate. É o que veja à minha volta.
    Tenho acessado muitos sites de vegetarianos, veganos ou de comida viva e tenho me surpreendido com a variedade de receitas e ingredientes. Já foi o tempo em que o vegetariano comia só arroz integral com gersal, proteína de soja ou queijos. Vale conferir.
    um abraço
    LENA

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  4. Olá Sônia

    Tenho uma dúvida e desculpe se o lugar onde a coloco não é o melhor. Você escreveu que "Dentes trincados ou rangendo à noite (bruxismo) são sintomas reconhecidos de vermes". Certo. E se isso acontecer durante o dia? Pode ser verme também?

    Obrigada!

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  5. Oi, Lena, é isso mesmo. Até para comer carne a pessoa tem que ser muito vegetariana, de modo a equilibrar as coisas. Um abraço!

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  6. Sem Nome, ranger dentes de dia: sim, sem dúvida podem ser vermes. Um abraço!

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  7. Sônia, que tipo de queijo vc recomenda. Estou tentando emplacar a dieta do dr. Barcelos. Há algum queijo liberado para tal dieta?

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  8. Sonia, você diz que até os macrobióticos aceitam um pouco de queijo na massa. Isso está nos livros do Professor Tomio? É que meus pais são macrobióticos e gostaria de conversar com eles sobre isso, pois não comem queijo de jeito nenhum e às vezes gostariam de poder, mesmo que um pouquinho...

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  9. Daniela, além dos livros do prof Kikuchi existem os do prof Michio Kushi e outros, li muitos. Mas não sei dizer onde está, sinto muito. Um abraço!

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  10. Eu costumava adorar queijo, mas após começar a dieta Barcellos, comê-los passou de prazer a concessão (quando convidado a comer fora de casa por exemplo), e decidamente não quero voltar atrás...
    Tudo bem que as percepções são individuais, mas hoje quando consumo queijos e seus parentes sinto nitidamente que pus para dentro algo que não vai facilitar a vida das minhas tripas, kkkk. Dependendo da quantidade interfere até no humor. Abraços.

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  11. É porque mexe com o fígado, né, Eduardo? Mesmo sendo maravilhoso, feito com leite cru e maturado comme il faut, pode cair mal... Um abraço!

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  12. Os veganos agradecem! Uma das materias que melhor explicam com embasamento o que o leite causa ... Agradecemos, Sonia, nossa admiraçao por seu trabalho segue mais forte!

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  13. Sônia, obrigada! Seu livro "Atchim" mudou a minha vida. E era asmática e vivia de bombinhas, antialérgicos e xaropes. Eu tomava 13 remédios! Depois que li o livro, larguei os laticínios, passei a consumir mais mel, gengibre e frutas de forno (maçã, banana e pera) e reduzi muito os farináceos. Não tive mais crises.

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  14. Eeeeba, Verônica, que sucesso! Muito obrigada pelo comentário - e continue firme!

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  15. Sônia, estou seguindo sua dieta radical, após a compra do livro: "candidiase, a praga" e estou sentindo muita falta de queijo :'(

    Sou vegetariana então estava muito acostumada a consumir tal alimento... Não existe um tipo que possa consumir? De cabra, de búfala?

    E obrigada pela ajuda e pelo excelente livro

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  16. Querida, é a falta do queijo que vai te ajudar a ficar boa. Como está no livro: recomendo ovos. E quem sabe carne. Já sei que você é vegetariana, também fui por mais de 10 anos, mas você precisa pôr a mão na consciência e avaliar por que ficou tão mal da candidíase. Ser vegetariana é bom para você? Um abraço!

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  17. Oi Sonia! Somos eu e minha mãe (e até minha Pequena de 5 anos!) suas fãs de carteira! Tenho diminuído o consumo de leite, mas não o aboli totalmente. Gostaria de saber sobre o minas padrão a que você se referiu como "o tal minas padrão". Porque? Muito obrigada! Alessandra

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