terça-feira, 31 de março de 2009

É o cumulus

Dos leitores: e-mail da Solange

Oi, Sonia, escrevo para dizer para suas leitoras uma coisa da minha experiência pessoal. Moro sozinha e não tenho quem cozinhe para mim. Tive um período em que, além de trabalhar, eu estudava à noite e dedicava pouco tempo a pensar no que ia comer, fora e dentro de casa; então comia muitas coisas fáceis de comprar e consumir - biscoitinhos, requeijão, torradas... No intervalo das aulas jantava capuccino com pãozinho de queijo... Enfim, me alimentava quase que só dessas coisas deliciosas que a gente come principalmente quando não pensa.

Essas comidinhas são que nem televisão, dão aquele torpor... Eu fiz Psicologia e numa determinada aula falaram que existem três tipos de drogas: as alucinogênicas, as excitatórias e as saciatórias, e a comida foi incluída entre as saciatórias, junto com barbitúricos e álcool, que na primeira fase excita mas depois dá torpor. É o gostoso de ficar pesada, como se estivesse relaxada, mas na verdade o que está acontecendo é todo um esforço a mais do organismo para dar conta de tanta coisa.

Com o tempo comecei a ficar mais inchada, com menos disposição na hora de acordar. Me sentia pesada, como se nunca tivesse tempo suficiente à noite para digerir tudo o que eu tinha consumido. Engordei pelo menos um quilo por ano e tinha muita prisão de ventre. Estava chegando a um limite, estava me sentindo muito mal. Insatisfeita com a minha sensaçào e com a forma corporal. Tinha me viciado naquela comida e precisava fazer uma coisa radical para mudar - uma coisa que envolvesse mudança de hábito e de crença mesmo. Resolvi me informar e levar a sério a informação.

De tudo o que li, o que mais me atraiu foi comer mais vegetais e me alimentar só de líquidos e frutas ate o meio-dia. Comecei a incluir na minha rotina ir uma vez por semana à feira. Passou a ser uma atividade que me dá o maior prazer, como ir à praia. Tenho prazer de escolher as frutas, as verduras, ver que a oferta muda de acordo com a época. Adoro descobrir o nome dos vegetais e perguntar ao feirante como faz, se é para comer cru ou comer quente - os feirantes em geral gostam de comer o que vendem.

E aí, quando sinto fome ou vontade de comer, tenho muita escolha de frutas e vegetais, em casa e no consultório. Não dá tempo de ficar tomando conta do fogão, mas soube de uma panela elétrica japonesa que cozinha arroz e comprei. Nela faço arroz integral, colocando 50% mais água, umas fatias de gengibre e uma colherinha de sal para conservar os minerais, e depois como com gersal e salsinha.

De sobremesa gosto de fazer vodus de frutas - espeto cravos nas maçãs, nas peras ou nos pêssegos, que são meus favoritos, na banana com casca, tudo com casca - e ponho para cozinhar abafadinho, com o fogo bem baixo. Isso porque no inverno percebi que é melhor comer a fruta quente; no começo eu comia tudo cru, mesmo que o tempo estivesse frio, e tive muita gripe.

Também gosto de tomar missoshiru antes de comer, fervo uma cebola, um alho-poró ou qualquer vegetal, desmancho o missô e acrescento cebolinha verde. É ótimo para os intestinos e dá muita energia no frio.

E é isso, Sonia, que eu queria dizer. Ter uma geladeira cheia das coisas certas significa emagrecer e ficar em forma, fisica e mentalmente. É você escolher e não ser escolhida pela comida. Posso dizer que isso mudou minha vida.

Um abraço

Solange

(PE)

sexta-feira, 27 de março de 2009

Almanaque do banheiro: Vermes? Melhor não tê-los!


Tem toda a razão o título acima: melhor não tê-los. Além de contrariarem profundamente nosso ideal de limpeza, o fato é que vermes pintam e bordam dentro do hospedeiro. Andam para cima e para baixo como se estivessem em casa, e quando querem se fixar usam ganchos, ventosas e dentes para se agarrar em nós. Machucam e destroem tecidos, invadem a corrente sanguínea e viajam pelo corpo inteiro, produzem toxinas ruins para nós, um horror. Alguns têm boca, aparelho digestivo e ânus; outros absorvem todos os nutrientes pela própria superfície do corpo, feito esponjas. Competem conosco pela comida, já que precisam das mesmas coisas para viver: proteínas, vitaminas, minerais, gordura – e glicose, muita glicose, que armazenam em forma de glicogênio e vão gastando em sua exaustiva vida de parasitas.
Causam não poucos danos, assim como as pragas de um jardim. Do mesmo jeito que uma planta cria fungos ou é comida por uma lagarta ou abriga centenas de ovinhos do que quer que seja e fica doente e morre, nossos tecidos externos e internos podem abrigar um sem-fim de parasitas. E não é qualquer sem-fim de parasitas não, é uma comunidade muito sofisticada que passa por vários estágios difíceis antes de conseguir se estabelecer direito. Como não tem proteção corporal contra agressões externas, precisa de um lugar quentinho e úmido para viver – de preferência com comida, e melhor: mastigada, engolida e digerida, fast-food de parasitas.
Agora, uma notícia boa e outra ruim. A ruim é que, do milhão e meio de espécies vivas identificadas até agora, mais de 2/3 são parasitas. A boa é que nenhum parasita tem interesse em matar o hospedeiro, porque estaria inviabilizando a própria existência.

Este post foi publicado novamente em 14/09/2011, em http://www.soniahirsch.com/2011/09/almanaque-do-banheiro-vermes-melhor-nao.html , por excesso de comentários aqui.

Tu és este


Tat twam asi
é a fórmula sânscrita que quer dizer Tu és este,
e que expressa a identidade fundamental de todos os seres
por trás da aparente multiplicidade;
fusão do mundo interior
com o mundo visível.

sábado, 21 de março de 2009

Almanaque do banheiro - Deixa sair


Há muita coisa que a gente põe pra dentro todo dia, depois não deixa sair e ainda reclama: Estou engordando! Meu intestino não funciona! Tenho o colesterol alto! Triglicerídeos! A glicose é alta também! Sinto cólicas menstruais horríveis, pedras nos rins e na vesícula, mau hálito, colite, diverticulite, rinite, sinusite, catarro nos pulmões, corrimento, alergias, suor fedido, ouvido meio surdo, articulações emperradas, cistos, tumores, varizes, ameaças de enfarte, ai, que dor de cabeça!

Curioso. Porque o nosso corpo é feito justamente pra deixar sair, e assim evitar qualquer doença. A gente faz coco, xixi, sua arrota, peida, expira, tosse, chora, menstrua, assoa o nariz, tem orgasmo e outras coisas pra se livrar de excessos que, em ficando, perturbam o bom funcionamento físico, mental e espiritual.

Aquela tensão na nuca é um excesso que tem que sair. Aquele ideal vibrando no peito um dia tem que sair. Talentos abandonados e apetites mal satisfeitos acabam virando doença.

Quando não se deixa sair, o final mais provável é o hospital. Por isso é que todo mundo tem que ter seguro médico-hospitalar, já que pode ficar doente a qualquer momento, e doença é despesa. Só que, como dizia Gandhi, a multiplicidade de hospitais não é sinal de civilização, é sintoma de decadência.

Não tem aquele papo de que pra baixo todo santo ajuda? Pois é: pra piorar, ta fácil.
A comida moderna, o stress urbano, a poluição, a crise econômica, a pasteurização cultural, tudo isso são pressões e invasões difíceis de evitar, que acabam fazendo a gente se sentir meio qualquer coisa, vivendo de qualquer jeito.

Mas é possível reagir a isso em outro tom, construindo um mundo interno forte e bem protegido. E também é possível aprender a eliminar os excessos de toxinas físicas e mentais através das cinco atividades essenciais da vida: alimentação, respiração, movimento, pensamento e relacionamento. São práticas simples, baseadas num princípio só, que é o entra-e-sai.

Olho vivo: a saída á a saúde. (DS)

terça-feira, 17 de março de 2009

Dicionário da mulher - Candidíase, a praga

Comecei a pesquisar sobre candidíase ali por 1993, por causa de uma dor debaixo da costela direita que não me deixava {fazer excessos} em paz. Era tomar um vinho, um suco de laranja ou comer amendoins que lá vinha ela. E quando topei com as notícias desse fungo chamado Candida albicans fiquei muito impressionada. Descobri que tinha os sintomas desde a infância (regada a açúcar), sem falar nas inúmeras crises de candidíase vaginal (monília) da adolescência em diante.

Em 1995 publiquei um capítulo sobre candidíase no meu livro Só para mulheres. Alguns anos depois, já instalada na vida online, recebia tantos emails a respeito do assunto que resolvi botar o capítulo no site. Triplicaram os emails. Continuei pesquisando e atualizando a informação online.

Enquanto isso passei a me cuidar com a mesma orientação que está lá. Adotei as cápsulas de lactobacilos acidófilos para sempre, o óleo virgem de coco, a redução de carboidratos. Posso dizer que a candidíase está controlada, bem como a hipoglicemia que costuma vir junto, mas percebo muito claramente que ela apenas manifesta uma tendência do organismo para umidade e calor, como se diz em medicina tradicional chinesa, e tendências são para sempre.

Descobri também que o câncer está quase sempre ligado à presença de fungos, o que piora muito depois da rádio e da quimio, que criam condições ideais para eles; alguns autores defendem que o câncer seria a própria simbiose da célula humana com a do fungo.

O capítulo Candidíase está em www.correcotia.com/mulheres/candidiase.htm .

E a dor debaixo da costela tinha também a ver com amebas, como entendi depois.

Sempre um gato

segunda-feira, 16 de março de 2009

João Moreira Salles sobre a Islândia

A reportagem mais impactante que li nos últimos anos. Também a mais educativa quanto ao capitalismo liberal. Já saiu há dois ou três meses, mas muita gente não leu.

http://www.revistapiaui.com.br/edicao_28/artigo_860/A_grande_ilusao.aspx

Sem aferventar o bacalhau

Que os portugueses descobriram o Brasil, não é novidade. Mas foi do outro lado do mundo, nos mares gelados do hemisfério norte, que fizeram sua descoberta essencial: o bacalhau. Peixe grande, de carne firme, que depois de salgado e seco aguentava meses de viagem sem estragar e sem perder o sabor. Talvez tenha sido o segredo das grandes navegações, já que fornecia nutrição de primeira e prazer inenarrável aos marujos do reino. Regado com o azeite que já produziam há séculos, mais umas batatas cozidas e um ovo duro por cima, o bacalhau virou tradição culinária tipicamente portuguesa e prato valorizado em toda a cozinha internacional.

Foi na Islândia e na Noruega que começaram a secar o bacalhau para levar em viagens, ainda no século 9. Os vikings comiam bacalhau. Mas sem sal. Sem azeite. Provavelmente sem ovo duro. Ou seja, praticamente não era bacalhau.

Cem anos depois, na Espanha, os bascos inventaram de salgá-lo antes de secar. Isso lhes deu chance de expandir um comércio muito lucrativo, proveitoso também para os pobres, já que o bacalhau era abundante, durava muito e custava pouco. Portugal, ali ao lado, apenas tornou divino o que já era perfeito. Hoje a maior parte da produção vem da Noruega, e o peixe está ameaçado de extinção. Pesca-se menos para preservar a espécie. E o preço, naturalmente, sobe.

O melhor bacalhau seco e salgado é o Porto, Portinho ou Codinho. Cor de palha, lombo alto e a carne se desmancha em lascas. Tão bom quanto ele é o Legítimo Porto, de carne mais clara e delicadamente fibrosa. Aí vêm o Saithe, de carne escura, fibrosa e sabor mais pronunciado, o Ling, com carne clara, sabor suave e boa consistência, e Zarbo, o mais barato, geralmente menor e mais magro. Junto ao tipo vem a classificação Imperial, Universal ou Popular. De novo, Imperial é o melhor.

Mas qualquer bacalhau fica gostoso quando bem preparado. Para isso, a primeira regra é tirar bem o sal debaixo da torneira e deixar 48 horas de molho em água fria, sempre que possível renovada. Se estiver calor, na geladeira. Se der vontade, terminar com três horas de molho no vinho branco.

A segunda regra é usar um bom azeite, qualquer que seja a receita. Pode fazer simplesmente toda a diferença, porque na verdade é ele que vai penetrar na carne e deixá-la macia.

Minha receita básica de bacalhau é: tirar o sal durante 48 horas, remover pele e espinhas. Cortar ou separar em pedações, colocar no fundo de uma panela grossa e regar com azeite extravirgem. Espalhar por cima rodelas de batata cozida em proporção igual à de bacalhau. Cortar em gomos bastante cebola e refogar com azeite em panela grossa, lentamente, até obter pétalas transparentes. Temperar com alho, sal, pimenta-do-reino, sementes de cominho e de coentro em pó. Colocar na panela sobre as batatas. Cortar em pedaços tomates tipo caqui, mais para verdes, sem pele, em volume semelhante ao das cebolas, e colocar crus sobre elas. Para completar, azeitonas pretas grandes, quartos de ovos cozidos, salsa e cebolinha por cima. Nova rega de azeite, e a panela fica ali, fria, tampada, esperando sua hora. Que acontece quando todo mundo já chegou: basta aquecer a mistura até o azeite começar a borbulhar.

Não aferventa o bacalhau? Não, para evitar que fique seco.

E os acompanhamentos? Brócolis, é claro, ou agrião refogado com seus talos, e painço, aquele cereal redondo, amarelinho, em vez de arroz.

Mas para o verão recomendo a salada de bacalhau, que pode ser feita até com as laterais magras do mais baratinho. De molho 48 horas, depois limpar, cortar em bocados pequenos ou soltar em lascas, colocar numa vasilha de louça com tampa. Misturar bastante alho picado (2 cabeças médias para um quilo de bacalhau) e cobrir com azeite extravirgem. Deixar curtindo na geladeira por no mínimo 24 horas, mas dura uma semana ou mais.

Servir frio e, sim, cru, com pão, azeitonas, cebola, rúcula, aipo, tomate, pimenta-do-reino, alcaparras, vinho, um bom papo – e as bênçãos portuguesas, com certeza!

(Da coletânea de crônicas Amiga Cozinha, que está no prelo)

Almanaque do Banheiro - A velhinha


A cena se passou num terreiro de umbanda. Corria a sessão normalmente quando alguém veio avisar ao Pai José que tinha uma velhinha passando mal. Pai José mandou trazer a velhinha – uma senhora pequena, magrinha, de seus 70 anos, com cara realmente de estar nas últimas. Sentaram-na numa cadeira. Pai José olhou, mediu, se concentrou, de repente perguntou baixinho para ela: Suncê peida, filha? A velhinha, agoniada, olhou em volta pedindo ajuda. Alguém traduziu: Ele quer saber se a senhora solta gases! A velhinha, agoniada que estava, mais ainda ficou. Pai José pediu então para fazer um chá bem forte de dente-de-leão, e enquanto isso colocou sua mão direita vibrando em direção à barriga da velhinha. Veio o chá, ela bebeu, e momentos depois soltava uma sonoríssima torrente de puns – e sua expressão foi se aliviando, as cores voltando, e ela começou a sorrir para o Pai José. Que sorriu de volta e comentou: Tem que peidar, né, filha? Senão, esse gás aí dentro vai fazer suncê sair voando pelo céu antes da hora...(DS)

sábado, 14 de março de 2009

Pra não perder o contato



Minha coluna na revista Bons Fluidos acabou, depois de quase nove anos, e não param de chegar emails indignados de leitores que não a encontraram na edição de março. Gente, tudo passa, tudo muda! Prova disso é que resolvi abrir este blog para poder continuar em contato com todo mundo que gosta de comer melhor.


Nove anos, no Quadrado Mágico chinês, são um ciclo completo. Cento e tantas colunas sobre os sabores da vida, também. Estava difícil encontrar assunto. Claro que as coisas importantes precisam ser repetidas mil vezes, mas é horrível quando a gente percebe que está se repetindo. Para evitar isso, quinze dias antes do prazo eu começava a me preocupar. Resultado: os projetos de livro iam ficando pra trás.

Agora, sem prazos nem preocupações, podem me chamar de pinto no lixo. Vai sair uma nova coletânea de crônicas e já mergulhei de novo em pesquisas mais profundas. Daqui a pouco começo a contar o que estou fazendo.